quinta-feira, 24 de junho de 2010

MARIA EMÍLIA DE SOUSA EM ENTREVISTA

Ver edição completa Presidente da Câmara lamenta corte de verbas para as autarquias, mas quer avançar com todas as obras já previstas A Presidente da Câmara de Almada diz estar seriamente preocupada com o corte de verbas via Orçamento de Estado às autarquias. Em entrevista ao Jornal da Região, Maria Emília de Sousa lembra que as câmaras têm de investir para ajudar a manter a economia local saudável, por isso teme que “medidas cegas” façam aumentar o desemprego. A autarca garante que Almada tem solidez financeira, mas receia que o poder central lhe estrague as contas. Apesar da crise económica, Almada continua a projectar obra. Isso significa solidez financeira? Almada é sólida do ponto de vista da sua gestão e receitas locais, isso foi construído ao longo dos anos e permitiu-nos enfrentar o embate da crise em 2009. Conseguimos fazer tudo o que estava planeado, mas a solidez adquirida não dura toda a vida. Muitas vezes digo que se o país fizesse uma gestão como a da Câmara de Almada, provavelmente não estávamos na situação em que estamos. A crise não começou agora, e se nós conseguimos construir, pagando a tempo e horas, é porque sempre fizemos uma gestão de muito rigor das receitas municipais. No dia em que a Câmara de Almada disser que se está a afogar, outros já estarão no fundo do mar. A quebra do sector urbanístico tem afectado as contas do município? Claro que tem. Quando não há transacções as receitas municipais descem. O urbanismo é um problema, mas nós nunca vivemos à custa destas receitas. As verbas que daqui resultam têm sido investidas para acompanhar o crescimento demográfico. O que realmente me preocupa é que a paragem deste sector gera mais desemprego. Ficam em risco empresas, e quando os empresários não têm disponibilidade financeira para pagar os empréstimos acumula-se o crédito mal parado nos bancos. Digamos que a construção ganhou um peso desproporcional na economia nacional. É evidente que é preciso mudar o paradigma da economia do país que assenta em muito na construção civil, mas isto não se muda de um dia para o outro. Em Portugal deixou-se acabar o sector da agricultura, assim como as indústrias de produção e transformadoras e apoiou-se a economia na construção. Foi um erro gravíssimo. É preciso mudar esse paradigma. Mas também não se pode fechar, de forma abrupta, a torneira à construção. Seria criar o caos. No caso de Almada a quebra nas transacções está a ser um problema. São muitos os prédios hipotecados e terrenos e lojas que não se vendem, com isto o Imposto Municipal de Transacções não entra. Este é uma das grandes fontes de receita dos municípios. Isto é apenas um indicador para o país. Se não forem tomadas medidas haverá mais desemprego e teremos uma situação verdadeiramente caótica. Seguindo a sua linha de raciocínio. Quando o Governo pondera reduzir em 100 milhões de euros as verbas transferidas para os municípios, temos um problema acumulado. Quando o Orçamento de Estado (OE) tira, de forma cega, 100 milhões de euros às autarquias e, ao mesmo tempo, aumenta o IVA, as nossas contas pioram muito. As autarquias financiam o OE quando toda a obra que fazem paga IVA, tal como qualquer empresa, portanto a verba que chega às câmaras não é real, tem de ser visto o que pagamos em IVA, que agora aumentou. Já fez as contas ao corte financeiro que Almada irá sofrer? Directamente vamos ter menos 700 mil euros, não sei ainda nas freguesias o que vai acontecer. Mas fazendo as contas com o aumento do IVA, o município caminha para perder cerca de 2 milhões de euros. E considerando que o poder central não tomou medidas políticas para animar a economia, podemos antever que as receitas municipais não serão recuperadas. Só para ter uma ideia, gastamos quase um milhão de euros em refeições para as crianças das nossas escolas. Perante a realidade das contas apetece-lhe desinvestir? Não posso. Por detrás de uma assinatura minha de despesa, está gente a trabalhar. Em cada reflexão que faço para cortar num projecto sou confrontada com a realidade de criar dificuldades a micro, pequenas e médias empresas. Estou sempre confrontada com os reflexos que cada decisão minha tem ao nível dos postos de trabalho. Mas o Governo já alertou que é necessário poupar. Desde que sou autarca não faço outra coisa senão poupar, por isso a Câmara de Almada tem solidez financeira. A orientação desta câmara, em cada ano, é travar a despesa corrente e ver o comportamento da receita.O que se diz agora que tem de ser feito, já fazemos há muito. Estas medidas cegas sobre as autarquias devem colocar-nos de prevenção, porque o poder local é aquele que falta privatizar. Tenho muito respeito pela iniciativa privada, mas o serviço público não poder ser esvaziado. O poder local é aquele que mais transformação conseguiu operar na sociedade, gerando ao mesmo tempo desenvolvimento económico e garantir postos de trabalho. É imune à crítica de que as autarquias empregam pessoas a mais? Quem quer assassinar o poder local faz afirmações dessas. Não sei onde se quer chegar com esses ataques, a menos que se queira voltar ao poder local nomeado no Terreiro do Paço. Isso o povo não quer! Existe uma estratégia, que não sei se vem de Portugal ou de onde, que quer acabar com o serviço público em áreas fulcrais para as populações. Mas sectores como Saúde, Educação, Águas têm de ser públicos. A Câmara de Almada vai ter de recorrer ao crédito bancário para fazer frente à crise? Não somos uma câmara endividada. É muito grave neste momento anunciar-se o endividamento zero das autarquias. Então e a Câmara de Almada que nunca se endividou? Não posso aceitar que pague o justo pelo injusto. As receitas baixam, mas estou a gerir: eu quero fazer tudo o que estava previsto para este ano. Quero manter as empresas que trabalham connosco a terem trabalho, portanto tenho nesta altura de recorrer ao crédito bancário para fazer obras. E não será a primeira vez que recorre ao crédito. Sim. Por exemplo para aproveitar o QREN e também porque tem havido crédito altamente bonificado. Nós fazemos uma gestão empresarial sem perder a noção do serviço público. Se há crédito barato o município aproveita. Por exemplo, recorri ao crédito para construir habitação social. Nunca recorremos ao crédito por aflição, mas não sei se isso poderá acontecer. Neste momento tem um pedido de crédito a decorrer. Temos um pedido de crédito à espera do visto do Tribunal de Contas e espero que não haja qualquer perturbação vinda de uma medida retroactiva que tenha influência sobre o que eu já tinha decidido muito antes. A Câmara de Almada é tida por pagar a tempo e horas. Vai continuar assim? Até ao dia de hoje todos os compromissos assumidos pela câmara têm cobertura.

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